17 de agosto de 2011

12 passos para entender o Muro de Berlim

Revista Monet 80 - Novembro 2009

Autor: Itaici Brunetti Perez e Dafne Sampaio

POR QUASE 30 ANOS, A ALEMANHA E SUA CAPITAL FORAM DIVIDIDAS POR UM MURO QUE TAMBÉM SEPAROU AMIGOS E FAMÍLIAS. A OBRA, FEITA DE CONCRETO E CERCADA POR ARAME FARPADO, MINAS TERRESTRES E TORRES DE OBSERVAÇÃO ARMADAS ATÉ OS DENTES DEIXOU MARCAS PROFUNDAS NO ESPÍRITO GERMÂNICO, ALÉM DE TER SIDO UM DOS RESULTADOS MAIS AGRESSIVOS DA GUERRA FRIA. LEMBRAMOS AQUI, DUAS DÉCADAS APÓS SUA QUEDA, ALGUMAS HISTÓRIAS DESSE ÍCONE DO SÉCULO 20 QUE AINDA EXISTE DENTRO DE MUITA GENTE (DO HUMBERTO GESSINGER, POR EXEMPLO)

DA NOITE PARA O DIA, E SEM AVISO PRÉVIO, exatamente à 1h05 da madrugada do dia 13 de agosto de 1961, a iluminação da rua do Portão de Brandemburgo foi apagada. Um batalhão de policiais, soldados e trabalhadores ligados à República Democrática Alemã (RDA), a Alemanha Oriental, vieram com cercas de arame farpado e blocos de concreto e, após seis horas, a capital germânica se viu partida pelo “muro da vergonha”.
“Em Berlim não é possível se perder, pois qualquer caminho vai dar no Muro”, refletia com alguma tristeza um dos anjos personagens de Asas do Desejo (1987), de Wim Wenders, um dos últimos filmes a flagrar o ícone do século XX de pé. Dois anos depois, um dos mais absurdos monumentos da Guerra Fria entre os EUA e a extinta União Soviética veio abaixo, para a alegria do mundo. Neste ano, quando são celebrados 20 anos do fim dessa concreta irracionalidade, o GNT exibe dois documentários. Muro de Berlim – Fuga para a Liberdade relata as tentativas de fuga de corajosos alemães do leste socialista. Já Berlim – Onde Está o Muro? trata desse amontoado de tijolos que ainda hoje assombra muitos alemães.


1 TIJOLO COM TIJOLO
Eram 155 km de comprimento (sendo que 43 dentro de Berlim), 67 km de grades metálicas com arame farpado, 127 km de cercas eletrificadas com alarme, 4 metros de altura, 302 torres de observação para controle e incontáveis soldados armados. Sem respeitar casas, prédios e ruas, o monumento de concreto foi levantado para impedir a migração da população sob regime comunista para o lado capitalista. Foi também a concretização, com o perdão do trocadilho, de uma separação que havia começado no fim da Segunda Guerra Mundial, quando o regime nazista caiu pelas armas dos Aliados (Estados Unidos, França e Inglaterra de um lado, e a União Soviética do outro). A Alemanha derrotada foi dividida em duas e numa madrugada de agosto de 1961 surgiu o Berliner Mauer, como era conhecido o muro pelos alemães.


2 A FACE LESTE
 No início, a República Democrática Alemã era um dos mais bem acabados exemplos de socialismo e conseguiu dar uma boa qualidade de vida à população, principalmente por causa do apoio financeiro da União Sovié­tica. Mas, a partir da década de 1970, todas as repúblicas socialistas passaram a sofrer na pele a falta de produtividade interna e os malefícios dos bloqueios econômicos capitaneados pelos Estados Unidos. Outro fator que piorou a situação foi a alta de preços do petróleo durante a crise de 1973. A dívida do bloco socialista foi aumentando e gerou uma forte crise econômica. Os alemães orientais não conseguiam nem reformar suas casas por falta de material (daí a permanente sensação de abandono que é percebida até os dias de hoje). A revolta era uma questão de tempo.




3 A FACE OESTE A parte ocidental de Berlim e, consequentemente, da Alemanha conseguiu curar rapidamente as feridas mais visíveis da Segunda Guerra Mundial (questões relacionadas ao nazismo ainda seguem vivas, mas isso é outra história). Afinal, os Estados Unidos e seu Plano Marshall, ou Programa de Recuperação Europeia, injetaram por volta de US$ 1,5 bilhão entre 1947 e 1951 somente na Alemanha. Mas nem tudo eram flores com uma capital dividida – e murada após 1961. O país se tornou peça central da queda de braço entre Estados Unidos e União Soviética, pois apenas uma estreita faixa de terra separava inimigos ferozes e ressabiados.

4 ESCAPADAS E PERDAS
Não existem números exatos sobre os mortos e feridos em tentativas de fuga de um lado para o outro de Berlim, pois a Alemanha Oriental censurava qualquer notícia sobre os incidentes. De um lado temos 270 mortes, segundo a Procuradoria Geral da República do país unificado e, do outro, as 1.065 vítimas registradas pela ONG 13 de Agosto (dados de 2004). Sabe-se que uma das primeira vítimas foi Gunther Litfin, cerca de dez dias após a construção do muro; a última foi Chris Gueffroy, em fevereiro de 1989, nove meses antes de sua queda.


5 ALEMANHA DE CHUTEIRAS
Em 1974 foi travada uma batalha dentro das quatro linhas futebolísticas entre as duas Alemanhas. A Ocidental sediava a Copa do Mundo e, por ironia do destino, caiu na mesma chave de sua pátria irmã. A Oriental, ofuscada pelo sucesso da vizinha capitalista, surpreendeu ao derrotar seu adversário por 1 a 0, mas acabou desclassificada e o time de Beckenbauer levou o título mundial. Mas existem boatos de que os alemães ocidentais entregaram o jogo para não pegar o Brasil na fase seguinte. A seleção de Zagallo ganhou da Alemanha Oriental também pelo placar mínimo, mas o máximo que conseguiu foi um 4º lugar.


6 SAI DE BAIXO – PARTE 1
Foi por causa de um mal-entendido na divulgação sobre novas leis para viagens – que fizeram milhares de alemães orientais fugirem em 1989 para a Áustria via fronteiras com a Hungria e a extinta Tchecoslováquia – que os alemães acabaram derrubando o muro em uma surpreendente revolução pacífica. Após 28 anos de repressão e violência era esperado que só um banho de sangue colocaria um ponto final no muro. Nada disso...


7 SAI DE BAIXO – PARTE 2
Só que foi preciso o apoio estratégico do premiê russo Mikhail Gorbatchev e dos Estados Unidos – em 1987, o presidente Reagan pediu em discurso histórico ao premiê russo que derrubasse o muro – para que os eventos de novembro de 1989 acontecessem desse jeito manso e feliz (afinal, de uma hora pra outra algumas entradas foram liberadas e as pessoas começaram a passar de um lado para o outro). Quem menos tinha interesse em ver essa cena acontecer era a dupla França e Inglaterra, que temia perder espaço na ordem mundial pós-Guerra Fria para essa nova Alemanha (o processo de reunificação foi finalizado em outubro de 1990).


8 ENTULHOS NA SALA DE JANTAR Após o desmantelamento da Alemanha Oriental e da unificação do país, um grande problema surgiu: como fazer o nivelamento social e econômico entre o rico lado ocidental e o pobre oriental? Foram feitos altos investimentos em universidades e na área química da ex-república socialista, mas mesmo assim a desigualdade se mantém preocupante. Para se ter uma ideia, em pesquisa de 2004 foi constatado que 25% dos alemães “ocidentais” gostariam que um muro voltasse a separar as Alemanhas (entre os “orientais” o número é de 12%).

9 INSPIRAÇÃO CONCRETA
Muito foi cantado, falado e filmado sobre o Muro de Berlim. Por exemplo, Roberto e Erasmo disseram que existia “o muro de Berlim entre eu e meu bem” (em música pouco conhecida de 1966), enquanto Humberto Gessinger lamentava a existência de um “Muro de Berlim dentro de mim” (na música “Alívio Imediato”, de 1989). Claro que tem mais: Pink Floyd e seu The Wall; David Bowie e a fase Berlin; e os irlandeses do U2, que se inspiraram na queda para o disco Achtung Baby, gravado em Berlim em 1991.


10 TURISTICAMENTE FALANDO
Após a queda, o local onde ficava o muro virou um previsível ponto de visita para gente do mundo inteiro. O próprio governo de Berlim incentiva o turismo, tanto que já investiu na reconstrução de alguns pequenos trechos do muro e torres de observação. Para a comemoração de 20 anos da queda, 120 artistas estão reformando os destroços do muro com as mesmas pinturas que havia originalmente no lado ocidental.


11 AGORA É TUDO FESTA Em 9 de novembro de 2009, as cenas da queda do Muro se repetirão, como parte da comemoração dos 20 anos de seu desmoronamento. Em sua linha imaginária serão colocados grandes painéis de plástico colorido, cada um com 1,30m, o que resultará em um efeito dominó que terminará diante do Portão de Brandemburgo. A comemoração ainda terá queima de fogos de artifício e shows musicais ao ar livre. Os painéis foram pintados por alunos da escola de Berlim. Comemorar é preciso.

12 CINEMA NO MURO
Berlim é, anualmente, sede de um dos maiores festivais do cinema mundial e sempre transpirou um charme natural para a sétima arte, desde os áureos tempos do expressionismo alemão, na década de 1920. Selecionamos alguns filmes que adotaram o Muro de Berlim como paisagem importante de suas tramas.


- Possessão (1981)
Uma jovem (Isabelle Adjani) abandona sua família por um amante, e o marido (Sam Neill) procura saber o que aconteceu. Ao lado do muro, descobre que o amante é um monstro.


- Asas do Desejo (1987)
No filme de Wim Wenders, um anjo se apaixona por uma trapezista de circo, e para viver esse amor precisa perder sua condição imortal. O romance se passa em Berlim, pré-queda do muro.


- Adeus, Lênin (2003)O filme retrata a queda de forma divertida e inteligente. Nele, Alexander (Daniel Brühl) esconde da mãe, que acorda de um coma, as mudanças da Alemanha dos anos 1990.

- Um Amor Além do Muro (2006)A trama se passa em 1961, logo após a construção. Rapaz conhece uma jovem poeta, cujo trabalho é proibido na Alemanha Oriental, e é apresentado ao rock, “essa música decadente”.

- Um Conto de 2 Springfields (2000)
Por causa de uma mudança na linha telefônica, Homer se revolta e cria um muro, dividindo a Nova Springfield da velha. No final, o muro é derrubado com um show do The Who.



 

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